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3 de setembro de 2012
PROJETO
Cidade do México e
São Paulo em contraste

As semelhanças e as diferenças entre as duas maiores metrópoles da América Latina, a capital mexicana e a capital paulista, foram analisadas no seminário inaugural do Projeto Comparativo São Paulo–Cidade do México, realizado nos dias 20 e 21 de agosto no IEA.

No evento, coordenado por Camila D´Ottaviano, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, e Martha Schteingart, do Colegio de México (Colmex), pesquisadores mexicanos e brasileiros apresentaram os trabalhos que vêm desenvolvendo sobre as duas cidades em cinco eixos temáticos: segregação, habitação e serviços urbanos; violência e direitos humanos; pobreza e lutas sociais; governo e políticas públicas; e meio-ambiente.

Segundo D´Ottaviano, a maior contribuição do seminário foi mostrar que, embora os problemas e desafios enfrentados por São Paulo e pela Cidade do México sejam muito semelhantes, as metrópoles apresentam diferenças estruturais profundas, sobretudo do ponto de vista político, legislativo e administrativo.

Em entrevista à jornalista Flávia Dourado, a pesquisadora fez um balanço do encontro, sintetizou os principais temas tratados e falou sobre o futuro do projeto.

Pelo próprio perfil dos participantes, o evento foi bastante interdisciplinar...

Isso. A cidade é um objeto essencialmente interdisciplinar. Se você não reunir em uma mesa pessoas de várias formações, você não consegue tratar de todas as questões, da complexidade das cidades. Porque a cidade é o objeto multi, pluri, interdisciplinar por excelência.


Camila D'Ottaviano:
"A cidade é o objeto multi, pluri, interdisciplinar
por excelência"

Qual o principal resultado dessa primeira análise comparativa entre a Cidade do México e São Paulo?

Conseguimos identificar muitas semelhanças entre as cidades: as duas são muito grandes, compõem regiões metropolitanas enormes e sofrem graves problemas urbanos, como violência, insegurança, carências na educação, entre outros. Mas, ao mesmo tempo, apresentam diferenças muito fortes, principalmente na estrutura política e em questões legislativas e administrativas. Então, no encontro percebemos que é preciso entender e explicar muito bem que diferenças são essas; diferenças estruturais que são determinantes na geração dos problemas urbanos das duas cidades.

Que diferenças de ordem política, legislativa e administrativa são essas?

Uma diferença importantíssima é que São Paulo é capital de um estado e a Cidade do Máximo é um Distrito Federal, capital de um país. Já a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) é formada pela capital e por uma série de outros municípios, cada um com suas particularidades e com certa autonomia conferida pela Constituição Federal de 1988. Mas todos, municípios e capital, são dependentes do governo estadual ou federal em alguns níveis. Então, a legislação urbanística, a regulação do uso do solo, o zoneamento, o plano diretor etc. são de competência municipal, enquanto normatizações mais amplas são de cunho federal, como a permissão ou não do aborto, por exemplo. No caso da Cidade do México, como se trata de um Distrito Federal, a autonomia é muito maior para algumas coisas e para outras não. Lá, eles podem definir sobre a questão do aborto, tanto que é uma prática legalizada na cidade. Essas diferenças todas têm um impacto enorme na regulação urbana. Por isso, constatamos que é preciso ter uma descrição inicial sobre como as duas regiões metropolitanas são estruturadas do ponto de vista político e administrativo para conseguir, de fato, analisar diferenças e semelhanças.

Sobre a questão de a Cidade do México poder legislar sobre o aborto, trata-se de uma autonomia exclusiva do Distrito Federal ou é algo comum a todos os municípios do país?

Pelo que entendemos, essa é uma questão sobre a qual os municípios podem legislar. E, do ponto de vista das políticas públicas, isso é uma coisa superinteressante. Como operacionalizar, no nível municipal, diferenças tão grandes em relação a uma legislação que não é referente ao uso do solo? Porque a nossa legislação é municipalizada em questões urbanas, do uso do solo. E o solo é do município, então é mais fácil. Mas, no caso da Cidade do México, se você quiser fazer um aborto, por exemplo, então basta se mudar para lá por um período?

"Os problemas são iguais,
mas a estrutura que os
gerou e as formas como
são geridos mudam"

Então os problemas são os mesmos, mas as soluções são diferentes?

Os problemas são iguais, mas a estrutura que os gerou e as formas como são geridos mudam. Por exemplo: eles também têm um grave problema com a violência, mas a estrutura organizacional da polícia é diferente. Aqui, a polícia militar é uma autarquia estadual, e lá é uma autarquia municipal. Então há uma diferença muito grande entre a segurança do distrito federal mexicano e a segurança dos municípios do entorno, da região metropolitana. Em São Paulo, até temos uma guarda municipal, mas o policiamento preventivo-repressivo é estadual. Isso é algo muito interessante, que eles vão tentar explorar num segundo momento do projeto, quer dizer, qual o impacto dessa estrutura organizacional da polícia nas questões de violência e segurança pública.

E isso dificulta criar políticas públicas unificadas...

Fica muito mais difícil. E essa é outra discussão que teremos de fazer num segundo momento: é interessante que o município tenha autonomia para uma série de coisas, mas em alguns assuntos as políticas públicas têm que ser centralizadas para não gerar tanta discrepância.

Muitos dos problemas de São Paulo derivam da profunda desigualdade social que há na cidade. O mesmo acontece na Cidade do México?


Apresentação da urbanista mexicana
Martha Schteingart no encerramento do encontro

Sim. Um exemplo, que não chegou a ser especificado no encontro, é a questão da dualidade social. Eu e a professora Suzana Pasternak [da FAU-USP e também participante do encontro] desenvolvemos uma pesquisa sobre essa dualidade, de análise da segregação socioespacial na RMSP. Essa realidade que temos aqui, de grandes áreas excluídas dentro da RMSP e de grandes condomínios de luxo, também existe lá. A concentração de renda nas duas cidades é muito alta. Na Cidade do México o fenômeno das favelas também é forte. O nome é outro, não é exatamente como as nossas, mas também existe essa forma de ocupação, de habitações irregulares e precárias.

Então ocorre lá o mesmo modelo de periferização da pobreza que vemos aqui?

Sim, o mesmo modelo. Analisando os dados do censo da RMSP, é possível identificar claramente no mapa as regiões onde vivem as pessoas com maior escolaridade e renda e onde há maior oferta de infraestrutura, tanto de sistema viário, de transportes, quanto de teatros, parques, áreas de lazer. Essas regiões ficam na porção central, entre os rios Pinheiros e Tietê, e em direção aos condomínios em Barueri. Olhando para a planta de da Região Metropolitana da Cidade do México, observamos a mesma coisa. Há áreas com grande concentração de infraestrutura, serviços, lazer e de população com renda mais alta, e áreas onde se concentram habitações precárias e pessoas pobres, com menos escolaridade. É fácil identificar os eixos da pobreza e os eixos da riqueza nas duas cidades.

"O problema do tráfego na Cidade do México é bem pior que o nosso"

A periferização contribui para o surgimento e agravamento de outro problema: o da mobilidade urbana. Na Cidade do México, a questão do trânsito é tão grave quanto aqui? A rede metroviária deles é muito maior que a nossa...

É. Eles têm um problema crônico de trânsito e deslocamento, comum em cidades muito grandes e espalhadas, em que a população pobre mora longe do trabalho, na periferia, e tem que se deslocar muito para trabalhar. A rede de metrô deles é realmente maior, mas o fluxo de veículos é terrível. Apesar de nosso sistema de transporte público ser pior, nossa malha viária está mais consolidada que a deles, então o escoamento para carros é um pouco mais bem resolvido aqui. Por isso, na verdade, o problema do tráfego na Cidade do México é bem pior que o nosso.

O que o projeto fará de agora em diante?

A partir do que foi discutido no seminário, vamos produzir uma primeira publicação com artigos que serão produzidos por todos os pesquisadores que apresentaram trabalhos. A publicação vai ser financiada pelo Colmex. Nossa ideia é depois transformá-la um livro aqui no IEA. Tendo os artigos prontos, vamos conseguir ver o que falta e definir o próximo passo. Feito isso, vamos organizar um segundo encontro lá na Cidade do México para dar continuidade à pesquisa.

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