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Punir, reparar e reconciliar como respostas à violação dos direitos humanos |
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Segundo o jurista francês Antoine Garapon, a violação dos direitos humanos tem suscitado três ações principais ao longo da história: punição, reparação e reconciliação. As particularidades e tensões de cada uma dessas ações foram discutidas no seminário Memória e Direitos Humanos, que aconteceu no dia 29 de novembro, no IEA.
Os expositores do encontro foram Renan Quinalha, doutorando no Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP, que tratou da questão Punir e Não Punir — Anistias; Glenda Mezarobba, professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, que abordou o tema Reparar – Indenizações; e Luci Buff, procuradora do Estado de São Paulo, que falou sobre Reconciliar — Comissões de Verdade. O debate foi conduzido por Rafael Schincariol, doutorando na Faculdade de Direito (FD) da USP. PUNIÇÃO De acordo com o doutorando, embora desempenhe papel fundamental em conjunturas de violações recentes de direitos humanos, "quando ainda se está no calor dos acontecimentos", a justiça de transição é precária e deve ser aplicada apenas em condições de instabilidade política. Fazendo referência ao caso brasileiro, ele afirmou que o debate sobre punir ou não punir, quase sempre restrito aos marcos dessa justiça, precisa ser situado em cenários de democracias já avançadas. "A democracia brasileira tem problemas, mas não me parece que o Brasil corra risco de regressão autoritária. O que justifica trazer esse conceito, que veicula uma lógica de excepcionalidade? Será que o debate deve ser feito em cima dessa conceituação ou deve ser feito a partir do direito ordinário?" Para ele, a utilização da justiça ordinária não só facilitaria as discussões sobre o assunto como enfraqueceria o discurso dos que se opõem à punição com base no argumento de que se trataria de revanchismo. REPARAÇÃO Partindo dessas ideias, a professora levantou algumas questões sobre os dois instrumentos de reparação da justiça brasileira, ambos relativos à ditadura militar: a lei nº 9.140, de 1995, que determina o pagamento de indenizações aos familiares de mortos e desaparecidos políticos; e a lei nº 10.559, de 2002, que estabelece o pagamento de indenizações a anistiados impedidos de exercer atividades econômicas em função da perseguição que sofreram. De acordo com a pesquisadora, as reparações pagas no âmbito das duas leis são desproporcionais. Para exemplificar, comparou a indenização recebida pela família do jornalista Vladmir Herzog, torturado e morto em 1975, e a indenização recebida por um anistiado, cujo nome preferiu não mencionar: o valor da primeira, pago em parcela única, ficou em cerca de R$ 100 mil, enquanto o da segunda, de caráter vitalício e retroativo, rendeu ao favorecido uma quantia maior em apenas um ano. "Quando o Estado brasileiro faz um esforço reparatório com duas leis que não partem da mesma perspectiva, diz que as perdas econômicas constituem um bem mais precioso que o direito a vida e à integridade física", observou, destacando que a disparidade entre as duas leis gera desconfiança cívica, ao invés de confiança. "No caso brasileiro, o esforço reparatório não conseguiu gerar ou fortalecer a solidariedade social, pois as pessoas acham que se trata de alguém se beneficiando do tesouro nacional". RECONCILIAÇÃO De acordo com a procuradora, as medidas de reparação e o debate suscitado pela aprovação da Comissão já contribuíram para a sensibilização da opinião pública, ainda que de maneira tímida. Para ela, esses avanços serão potencializados pelo início dos trabalhos da comissão, quando as vítimas passarão a ser ouvidas em audiências abertas, os testemunhos começarão a ser colhidos e os fatos serão esclarecidos. "Até porque um dos sentidos da reconciliação, que é estabelecer uma maior confiança nas instituições, já faz parte do próprio processo da comissão". Ela advertiu, ainda, que não se deve fazer da reconciliação um ritual vazio, apenas com pedidos de desculpas: "A discussão sobre a reconciliação exige cuidados, pois é algo que pode ser tomado erroneamente como um sucedâneo do perdão". CICLO |